O Dia em que o Mirassol Enfrentou o Santos de Pelé e Foi ao Maracanã
O Dia em que o Mirassol Enfrentou o Santos de Pelé e Foi ao Maracanã
No vasto universo do futebol brasileiro, repleto de gigantes e histórias consagradas, existem episódios singulares que parecem ter escapado dos grandes registros. Um deles envolve o Mirassol Futebol Clube, time do interior paulista, e uma jornada improvável que o colocou frente a frente com a lenda Pelé e, posteriormente, no templo máximo do futebol nacional, o Maracanã. Esta é a curiosa história de como um clube do interior viveu, em poucos dias, o sonho de qualquer time brasileiro.
A saga tem seu marco inicial em 1974. O Mirassol, então um clube amador fundado apenas cinco anos antes, em 1969, vivia sua realidade local no interior de São Paulo. No entanto, um convite inesperado mudaria seu destino temporariamente. O clube foi selecionado para ser o adversário do Santos Futebol Clube em um amistoso preparatório. O detalhe que transforma esse jogo rotineiro em uma peça de colecionador é que o Santos daquela época ainda contava em seu elenco com Edson Arantes do Nascimento, o Rei Pelé, que retornara ao clube após sua passagem pelo New York Cosmos e se preparava, na verdade, para sua despedida dos gramados brasileiros.
O amistoso foi realizado no Estádio Municipal de Mirassol. Imagine a cena: um time de amadores, representando uma cidade com poucos milhares de habitantes, recebendo a visita do maior jogador de todos os tempos e de um dos clubes mais famosos do planeta. Não há registros detalhados do placar final – fontes da época e memórias de torcedores mais antigos sugerem uma goleada santista, algo esperado dado o abismo técnico –, mas o resultado em si é o menos importante. O fato histórico, pouco difundido nas crônicas gerais do futebol, é que o Mirassol teve a honra, única e irrepetível, de ser o adversário de Pelé em um de seus últimos jogos no Brasil por seu clube de coração, o Santos. É um registro que coloca o pequeno clube do interior em um nicho especial na história: o de ter compartilhado o gramado com o Rei em sua despedida tupiniquim.
Mas a história não para aí. Impulsionado pela visibilidade desse amistoso de alto nível, o Mirassol embarcou em uma aventura ainda mais ousada. No mesmo ano de 1974, o clube foi convidado a participar de um torneio amistoso no Rio de Janeiro. E não jogaria em qualquer estádio: a partida estava marcada para o Estádio do Maracanã, o então maior palco do futebol mundial. O adversário seria o Campo Grande Atlético Clube, time tradicional da capital fluminense. Para um clube que sequer possuía status profissional, jogar no Maracanã era algo surreal, uma experiência digna de times da elite nacional.
Os detalhes dessa excursão carioca são um testemunho do amadorismo heroico da época. Conta-se que a delegação do Mirassol viajou de ônibus, em uma longa jornada por estradas, para chegar ao Rio de Janeiro. A experiência de pisar no imenso gramado do Maracanã, diante de uma arquibancada vasta e praticamente vazia para um amistoso de baixo apelo, deve ter sido avassaladora para aqueles jogadores do interior. Assim, em um intervalo curto de tempo, o Mirassol viveu dois extremos do futebol brasileiro: a intimidade de um confronto com Pelé em seu estádio municipal e a grandiosidade anônima de atuar no colossal estádio do Maracanã.
Este duplo episódio de 1974 é mais do que uma simples curiosidade. Ele simboliza a democracia e os caminhos inesperados do futebol brasileiro. Em uma era sem a globalização e a padronização de hoje, eram possíveis esses encontros entre o gigante absoluto e o pequeno aspirante, entre o templo nacional e o time da cidade pacata. Para o Mirassol, que décadas mais tarde se profissionalizaria e alcançaria séries nacionais, esses eventos permanecem como a pedra fundamental de sua mitologia, um passado que antecede seus feitos modernos e que o conecta, mesmo que por um fio, à história maior do esporte no país. É a prova de que, no futebol, até o time mais modesto pode, por um instante, tocar a lenda e pisar no céu.
— Lance do Jogo
